MP denuncia empresário do agro por morte de piloto em queda de avião em MG
Presidente do Grupo Farroupilha, Inácio Carlos Urban, foi denunciado por homicídio culposo mais de quatro anos após acidente em Coromandel, no Alto Paranaíba
O presidente
e fundador do Grupo Farroupilha — conglomerado ligado ao agronegócio com sede
em Patos de Minas — foi denunciado pelo Ministério Público de Minas Gerais
(MPMG) por homicídio culposo (sem intenção de matar) em razão da morte do
piloto Rodrigo Carlos Pereira, aos 39 anos. A vítima pilotava uma aeronave
destinada à pulverização de agrotóxicos, que caiu na pista de pouso da Fazenda
São Francisco, no município de Coromandel, no Alto Paranaíba, em Minas Gerais,
em 2020.
Conforme
consta no inquérito policial que fundamentou o parecer do Ministério Público, o
empresário Inácio Carlos Urban, proprietário do avião envolvido no acidente, um
modelo EMB 202A, da Embraer, contratou o mecânico Rogério Dalla Santa para
prestar serviços de manutenção. Porém, o profissional não possuía a habilitação
necessária na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).
Com isso,
Dalla também foi denunciado pelo MP por homicídio culposo. A pena varia de um a
três anos de detenção. No entanto, o promotor Edon Rodarte solicitou na
denúncia — assinada na quarta-feira (21/8) e encaminhada à Justiça — que o
empresário e o mecânico sejam condenados com aumento de um terço na pena,
conforme prevê o Código Penal em casos de "inobservância de regra técnica
de profissão".
Segundo
Rodarte, o mecânico possuía formação técnica que não o habilitava a realizar
intervenções em tais equipamentos, apenas a prestar consultoria em manutenção
de aeronaves. "Além da ausência de qualificação e habilitação técnica, foi
apurado que os reparos da aeronave eram realizados em locais improvisados e que
as peças utilizadas eram inadequadas", afirma.
Por fim, o
promotor destaca que Rogério foi o autor do crime de homicídio culposo por
inobservância de regra técnica de profissão, e Inácio "participou
culposamente do delito". A promotoria ainda observa que o empresário foi
omisso "por inércia própria", pois era responsável por garantir
condições seguras de trabalho.
A reportagem
entrou em contato com a assessoria do Grupo Farroupilha e um dos advogados do
empresário, mas não obteve retorno até o fechamento desta publicação. A defesa
do mecânico Rogério Dalla Santa não foi localizada. O espaço permanece aberto
para manifestações.
Rodrigo
Carlos Pereira ao lado da esposa, Patrícia Cristina da Silva Pereira, e dos
filhos, que, à época do acidente, tinham 3 e 5 anos
Rodrigo
Carlos Pereira ao lado da esposa, Patrícia Cristina da Silva Pereira, e dos
filhos, que, à época do acidente, tinham 3 e 5 anos - Arquivo pessoal
FAMÍLIA DE
PILOTO PEDE R$ 9,8 MILHÕES EM INDENIZAÇÃO
A defesa da
família do piloto solicita à Justiça trabalhista uma indenização de R$ 9,8
milhões. "O montante considera a incorporação no salário oficial de R$ 4
por hectare pulverizado, pois esse valor era pago 'extra folha' como forma de
isentar o empregador dos encargos legais. Também inclui verbas trabalhistas
referentes aos valores pagos informalmente; compensação por danos morais em
favor das duas crianças órfãs e da viúva; e reparação por danos materiais,
mediante pensionamento para as duas crianças e a viúva", explica o
advogado Rodrigo Marra.
Os advogados
do empresário, por sua vez, requerem à viúva o pagamento de pouco mais de R$
932 mil a título de danos materiais. Esse valor visa cobrir o prejuízo
decorrente das avarias na aeronave. Além disso, pedem que sejam acrescidos
juros de 1% ao mês até a data do efetivo pagamento. "Em valores
atualizados, a quantia ficaria em aproximadamente R$ 1,3 milhão", completa
Marra.
O
requerimento da defesa do empresário foi apresentado à Justiça em resposta à
ação movida pela viúva no Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-MG)
após a morte do marido. Além da indenização milionária, ela solicita à Justiça
trabalhista o reconhecimento de que cerca de 80% do salário era pago ao
companheiro sem o devido recolhimento de impostos, o que possibilitaria a
revisão da pensão.
QUEDA DEZ
MINUTOS APÓS DECOLAGEM
Visando à
pulverização de agrotóxicos, Rodrigo Carlos Pereira decolou no dia 7 de
fevereiro de 2020 do aeródromo de Coromandel e caiu na cabeceira da pista de
pouso da Fazenda São Francisco, próximo a uma lavoura de milho, dez minutos
após a decolagem. O acidente ocorreu no primeiro voo após os reparos realizados
pelo mecânico Rogério Dalla.
O piloto,
que exercia a função há cerca de 12 anos, conforme relatado pelo MPMG, chegou a
ser retirado com vida do avião, mas faleceu a caminho do pronto-socorro do
município. Rodrigo deixou uma esposa e dois filhos, que, na época do acidente,
tinham 3 e 5 anos.
Quatro anos
após a queda da aeronave, a Polícia Civil encerrou o inquérito em 12 de abril
deste ano e o enviou ao Ministério Público. No documento assinado pelo delegado
Leandro Fernandes Araújo consta que a aeronave pilotada por Rodrigo e destinada
à atividade aeroagrícola apresentava defeitos "gravíssimos", como
superaquecimento, vazamento de óleo do motor, corte de combustível e panes
elétrica e termostática.
DEFEITOS
CRÔNICOS NAS BOMBAS DE COMBUSTÍVEL
O relatório
do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa)
revelou que os tanques de combustível estavam íntegros, mas completamente
vazios. Além disso, os "demais componentes do motor apresentavam ausência
de combustível residual". As marcas no solo indicaram que a aproximação da
aeronave teve um "grande ângulo de descida".
No laudo
pericial judicial apresentado nos autos da reclamação trabalhista, o perito
concluiu que o piloto não considerava a possibilidade de pane seca — ou seja,
quando o sistema não fornece combustível suficiente para o correto
funcionamento do motor. O documento revelou que o piloto solicitou o
abastecimento do avião mais do que o necessário para o trajeto de ida e volta.
Os defeitos
crônicos nas bombas de combustível, bem como a posição inadequada dos
indicadores de nível e sua imprecisão, contribuíram para o atraso na decisão do
piloto em uma situação de emergência, conforme descrito no inquérito. Ainda
segundo a perícia, o mecânico usou uma bomba não original, o que "poderia
levar à perda ou consumo excessivo de combustível em voo".
Fonte e
imagens – ESTADO DE MINAS