Ressocialização: Paciente psiquiátrico que estava preso em Uberlândia há sete anos, reencontra família no Ceará
O homem tem diagnóstico de esquizofrenia e não tinha nenhum parente na cidade.
Progredir no
cumprimento de pena para o regime aberto, na condição de paciente psiquiátrico,
com diagnóstico de esquizofrenia e sem nenhum parente em Uberlândia seria a
certeza de Halyson Lima Alves, 38 anos, abandonar a medicação e o
acompanhamento médico, deixar de ser responsável por suas ações, voltar a
cometer crimes e, consequentemente, reingressar no sistema prisional.
Felizmente, graças a uma articulação do Sistema Prisional com a Defensoria
Pública e o Tribunal de Justiça, isso não aconteceu.
Na semana passada, no dia
3/8, após sete anos preso no Presídio de Uberlândia I (Professor Jacy de
Assis), no Triângulo Mineiro, Halyson embarcou no aeroporto de Uberlândia,
escoltado por dois policiais penais, em um voo para Campinas (SP). Fez conexão
com os policiais para a cidade de Juazeiro do Norte (CE), para em seguida
viajar 70 quilômetros de carro até Brejo Santo (CE), chegando uma hora da madrugada
do dia 4/8, onde voltou a morar com o pai, a mãe e um filho. Durante todos os
anos de prisão em Minas a família sempre esteve a mais de 2 mil quilômetros de
distância.
O reencontro somente foi
possível com o apoio da Defensoria Pública, que conseguiu que o juiz da Comarca
de Uberlândia vinculasse o regime aberto à prisão domiciliar, para tornar
possível a escolta até o Ceará e o retorno de Halyson para morar com sua
família.
A subdiretora de Humanização
do Atendimento do Presídio de Uberlândia I, Janaína Pessoa, faz questão de
deixar claro o significado do conceito de ressocialização no sistema prisional:
oferecer dignidade, tratamento humanizado, conservando a honra e a autoestima
do preso. “Foi muita emoção fazer parte
desta força-tarefa em busca do retorno de Halysson ao seio familiar. É o
resultado esperado, diante de um trabalho árduo, cheio de limitação, o qual não
podemos nos prender ao impossível. Realmente, a união das forças e o trabalho
em equipe fazem toda a diferença”, avalia.
Agora, Halyson cumpre prisão
domiciliar em Brejo Santo (CE), e seu vínculo é com o Tribunal de Justiça do
Ceará. Uma vez por mês, ele tem que se apresentar no Fórum do município para
assinar o termo de compromisso do regime aberto com prisão domiciliar.
Trajetória
Em meados de 2013, quando
estava preso na Penitenciária de Uberlândia I (Professor João Pimenta da
Veiga), Halyson recebeu alvará de soltura e foi recebido pela mãe e um tio,
sendo levado de volta ao Ceará. Mas em 2014 ele retornou para a Região do
Triângulo, onde cometeu novos crimes e, pelos seus relatos muitas vezes
desconexos, devido aos transtornos mentais, parece ter sido morador de rua. No
reingresso ao sistema prisional foi conduzido para o Presídio de Uberlândia.
Por se tratar de paciente
psiquiátrico, foi acompanhado pelo Serviço de Saúde Mental do município, com
passagens pelo Ambulatório de Psiquiatria da Universidade Federal de Uberlândia
(UFU), por um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), e ainda pela equipe
Psicossocial e de Saúde da unidade prisional, bem como pela equipe do Projeto
Além das Grades. Ele esteve acolhido em uma das celas no Núcleo de Saúde, em
razão de ser uma pessoa com dificuldade de assumir-se como sujeito responsável
por suas ações, necessitando de apoio e atenção diferenciados, incluindo
medicação supervisionada.
Ao final de 2019, por meio de
diversas buscas dos profissionais do Serviço Social do presídio, foi possível
conseguir o telefone da mãe, porém, os contatos eram limitados pela dificuldade
de acesso a sinal telefônico. Foi um trabalho de investigação, com a ajuda de
servidores do Fórum, da Polícia Militar e do Centro de Referência Especializado
de Assistência Social (CREAS).
Em abril de 2020, em razão da
sua progressão de regime para o semiaberto, com benefícios externos, os quais
ele cumpriu dentro da unidade prisional por não reunir condições de sair, e
sequer ter estrutura familiar na cidade, o contato familiar foi intensificado,
sendo realizadas algumas visitas virtuais com a mãe, a irmã e o filho,
permitindo resgatar os vínculos afetivos.
Parentes imaginários
No Núcleo de Saúde do
Presídio de Uberlândia, Halyson teve um companheiro de cela chamado Sebastião
Lino, 43 anos. Ele não possui transtornos mentais, mas um sério problema de
coluna. O Lino, como é chamado pelos servidores da unidade, tornou-se “irmão”
de Halyson e teve um papel fundamental no tratamento e melhora de seu colega. “Sempre falei com ele sobre a importância de
tomar corretamente os remédios e de parar de pensar no passado. Quando começava
a bater com a cabeça contra a parede eu conversava com ele e conseguia
acalmá-lo. Aprendi com Halyson a ter paciência e a fazer origami”, relata
Lino.
Halyson aprendeu a fazer
origami quando esteve preso na Penitenciária de Uberlândia (Professor João
Pimenta da Veiga). Após apresentar melhoras significativas na saúde mental,
relembrou das técnicas da arte japonesa de dobradura de papel e passou a
ensinar ao colega que se tornou amigo/irmão.
A assistente social Márcia
Aurélia Caldeira tornou-se a “mãe mineira” de Halyson. A psicóloga era a avó,
um dos policiais penais atuantes dentro do pavilhão carcerário era o pai. Mas
essas relações de parentesco eram apenas uma forma de o paciente se sentir
seguro e acolhido, pois ele sabia exatamente quem era quem, explica a assistente
social.
Um dos maiores medos e
vergonha de reencontrar a família era a falta de praticamente todos os dentes
da arcada dentária superior. Quem resolveu o problema foi uma dentista da
unidade, encomendando uma prótese total removível (PTR). Foi o suficiente para
o restabelecimento de um largo sorriso e mais um estímulo para o retorno ao
lar.
“Já tivemos diversos pacientes psiquiátricos aqui no presídio,
mas este foi um caso especial. Conseguimos, graças ao apoio de muitos
profissionais, ajudar e encaminhar o Halyson, com os devidos cuidados
necessários, para junto de sua família. Temos mantido contato com ele por
telefone”, conclui
feliz a “mãe mineira”.
Fonte: DEPEN
/ Foto de capa: Divulgação ASCOM Sejusp