Trabalhadores invisíveis: estudo da Fiocruz analisa condições de trabalho dos profissionais de saúde durante a pandemia
Trabalhadores da saúde podem acessar o site da Fiocruz e responder questionário sobre condições trabalhistas durante enfrentamento da Covid-19. Objetivo da pesquisa é auxiliar em políticas públicas voltadas para a categoria
“Somos artistas. O saco de lixo vira avental e o
esparadrapo vira adesivo para curativos em pele sensível”, relata o técnico de
enfermagem, Francisco Elivaldo Machado, que atua no enfrentamento a Covid-19.
Assim como Francisco, diversos trabalhadores técnicos, auxiliares e de apoio
das equipes de saúde enfrentam péssimas condições de trabalho e pouco se sabe
sobre o perfil e a real situação deles. Pensando nisso, a Fundação Oswaldo Cruz
(Fiocruz) está realizando uma pesquisa online denominada “Os trabalhadores
invisíveis da Saúde: condições de trabalho e saúde mental no contexto da
Covid-19 no Brasil”.
O objetivo do estudo é analisar as condições de
vida, o cotidiano e a saúde mental dessa força de trabalho buscando saber as
alterações a que tiveram que se submeter emergencialmente durante a pandemia.
O questionário, que pode ser acessado no site da
Fiocruz até o final de junho, busca saber informações sobre o dia a dia desses
profissionais durante a pandemia, como por exemplo, se o trabalhador teve
Covid-19 e se sente protegido no ambiente de trabalho contra o vírus, se sofreu
algum tipo de violência ou discriminação, o que mudou em sua rotina
profissional durante a pandemia e se houve mudança da carga horária de
trabalho, se há equipamentos de proteção individual (EPI) disponíveis e se
houve treinamento adequado para a utilização, entre outros questionamentos.
A pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública
da Fiocruz e coordenadora da pesquisa, Maria Helena Machado, explica o porquê
desses profissionais serem considerados invisíveis. “Tem a ver com a
invisibilidade social desses trabalhadores. Eles são essenciais no sistema de
saúde e percebemos que no cotidiano desses profissionais, eles não são vistos
como deveriam, alguns deles, inclusive, são submersos.”
A coordenadora destaca ainda que alguns
profissionais não têm voz dentro do ambiente de trabalho. “Em uma equipe de
saúde existe o técnico de radiologia, o técnico de laboratório e o de
enfermagem, ou seja, é um conjunto de trabalhadores que atuam, muitas vezes, na
equipe de saúde. E no próprio grupo esses profissionais não são vistos com a
visibilidade social que deveriam ter. Muitas vezes, ou quase sempre, eles não
são considerados para dar opinião sobre o caso ou falarem sobre a situação do
paciente ou condição do problema de saúde”, diz Maria Helena.
Para o técnico de enfermagem, Francisco Elivaldo
Machado, as classes sem ensino superior são sempre as mais esquecidas. “Sabemos
que a categoria é invisível para todas as pessoas. Os governantes e as grandes
empresas apenas veem a visão do médico dentro do ambiente hospitalar e esquecem
as demais, como o pessoal da higienização, o pessoal que trabalha no
necrotério, o vigilante e os profissionais de saúde que são os enfermeiros, os
técnicos de enfermagem e auxiliares, que apenas são lembrados quando o paciente
chega no hospital e nos enxerga”, reclama.
De acordo com a Fiocruz, estima-se que no país haja
mais de 2 milhões de trabalhadores de nível técnico, auxiliar e apoio, dos
quais 1,5 milhão estão na linha de frente do enfrentamento à Covid-19. Cerca de
1.800 milhão são auxiliares e técnicos de enfermagem, 230 mil são auxiliares e
técnicos de saúde bucal, 29 mil são técnicos de laboratório, 20 mil são
técnicos de nutrição e 85 mil são técnicos de radiologia.
A proposta do estudo é gerar dados mais precisos e
informações que auxiliem às entidades profissionais na fundamentação e
formulação de propostas de melhorias para o sistema de saúde brasileiro, além
de ajudar no desenvolvimento de ações estratégicas e políticas públicas.
O setor de funerárias também segue invisível durante
a pandemia, mas de acordo com a presidente da Associação de Funerárias do
Distrito Federal, Tânia Batista, o problema maior está na separação dos corpos
contaminados com o vírus. “A maior dificuldade para o setor funerário é chegar
no hospital e se deparar com os corpos misturados, sem saber quais estão
contaminados com a Covid-19 e quais não. Temos conversado com a Secretaria de
Saúde do Distrito Federal, mas há um descaso muito grande com o nosso trabalho
e uma falta de responsabilidade”, afirma.
Os resultados da pesquisa serão divulgados entre
julho e agosto e os dados poderão ser discutidos com sindicatos, confederações,
academias, conselhos nacionais, estaduais e municipais de saúde. “Gostaríamos
também de ver essa pesquisa discutida no Congresso Nacional, é muito importante
que os nossos parlamentares fiquem atentos e apoiem os trabalhadores de saúde,
pois muitos estão adoecendo e morrendo em decorrência do coronavírus contraído
no ambiente profissional”, concluiu Maria Helena.
Confira abaixo mais detalhes sobre o assunto e a
entrevista na íntegra com a coordenadora e pesquisadora da Escola Nacional de
Saúde Pública da Fiocruz, Maria Helena, sobre “Os trabalhadores invisíveis da
Saúde: condições de trabalho e saúde mental no contexto da Covid-19 no Brasil”.
Fonte: Agência Minas