Estudo mostra que Brasil teve 211 mil mortes a mais do que o esperado para o começo de 2021
Dados do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) entre 1 de janeiro e 17 de abril deste ano mostram um excesso de mortalidade de 64%, e especialistas citam reflexos diretos e indiretos da pandemia
O Brasil perdeu 211.847 vidas a mais do que o
esperado para o começo deste ano. O número é resultado de uma pesquisa
realizada pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), que mostra
um excesso de mortalidade de 64% entre 1º de janeiro e 17 de abril de 2021.
Para chegar aos resultados, os pesquisadores
avaliaram a quantidade de mortes naturais no período, ou seja, aquelas causadas
por doenças ou mau funcionamento interno do corpo, incluindo os óbitos em
decorrência da Covid-19. Os números foram, então, comparados com a projeção da
mortalidade estimada a partir da série histórica de óbitos registrados pelo
Sistema de Informação de Mortalidade entre 2015 e 2019.
A dimensão das mortes é tamanha que pode ser
comparada com a população do município de Angra dos Reis, no Rio de Janeiro. O
total de óbitos acima do esperado é como se todos os habitantes do município e
outros quase 5 mil visitantes tivessem morrido em quatro meses e meio, segundo
observação dos pesquisadores.
Em 2020, o excesso de mortalidade foi de 22%,
com 275.587 mortes identificadas a mais do que o esperado, em números
absolutos. Os dados são mais fatais para a população masculina e de faixa
etária até 59 anos. Para os homens, o número esperado de óbitos era de 171.132
até a semana de 11 de abril, mas houve um excesso de 115.843 mortes.
Causas
A infectologista Ana Helena Germoglio explica
o que significam os conceitos da pesquisa. “O excesso de mortalidade nos
representa a quantidade de óbitos, de causa natural, que ocorreram e que não
eram esperados naquele determinado período. Esse dado deve ser utilizado para
que a gente possa avaliar a magnitude, ou seja, o impacto das doenças na
população naquele ano avaliado, além de poder avaliar a eficácia do sistema de
saúde no atendimento à população”, diz.
Ela lembra que essas vidas perdidas são consequências não só da pandemia do
novo coronavírus, mas também de outras enfermidades e do contexto de
atendimento à saúde atual. De acordo com a especialista, os dados podem servir
como base para a construção de políticas de prevenção.
“211 mil mortes a mais do que o esperado no
ano não acontece do nada. Isso é o reflexo direto e indireto da Covid-19 sobre
nós. O reflexo direto são as pessoas que realmente morreram pela doença. O
indireto são as outras pessoas, com outras doenças, que tiveram seu atendimento
retardado, ou por falta de leitos ou por medo de procurar o serviço de saúde e
eventualmente contrair a doença”, avalia.
Diagnósticos
e caminhos
O Painel de Análise do Excesso de Mortalidade
por Causas Naturais no Brasil em 2021, realizado pela Conass em parceria com a
organização global de saúde pública Vital Strategies e com a Associação
Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil), mostra também
detalhes segmentados por regiões. Os estados de Amazonas, Rondônia e Goiás são
os que registraram os maiores excessos de mortalidade proporcional à população.
Em Amazonas, por exemplo, onde houve um dos
cenários de maior agravamento da crise sanitária na pandemia, o excesso chega a
173% no período analisado, mais do que o dobro da média nacional. Na outra
ponta da tabela, com os menores quantitativos, está o Piauí, com 18% de excesso
de mortalidade.
Carla Pintas, professora do curso de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília
(UnB), ressalta que o contexto do território nacional exige avaliações das
diferentes vulnerabilidades das mais diversas realidades. Para ela, os
municípios têm uma parcela importante para a contribuição no fortalecimento da
atenção primária.
“Já há estudos mostrando que esse aumento de
excesso de mortes por causas naturais também tem acontecido em outros países,
mas, no caso do Brasil, a gente tem diferenças regionais importantes que devem
ser consideradas. Em especial, a gente precisa verificar essa vulnerabilidade
da população e pensar que a atenção primária pode, hoje, ser o serviço básico
que pode estar presente para todos os brasileiros.”
A professora acredita que o atendimento
primário, fortalecido por sistemas como as Unidades Básicas de Saúde (UBS) ou
Estratégia de Saúde da Família (ESF), é essencial para alcançar os brasileiros.
“A atenção primária está colocada como serviço fundamental em todos os
municípios do país. Ela tem acesso à população e consegue verificar a sua
vulnerabilidade, a sua necessidade. Ela está presente nos locais de difícil
acesso. Então, essa é uma questão importante para a gente considerar”.
Foto de capa: Portal Tecmundo/Fonte: Brasil 61